Guy Debord, 1973.
Em conversa com Deleuze, Foucault
dizia (o que já havia dito em seus livros anteriores, sobretudo em “A defesa da
sociedade”) que as lutas antijudiciárias provêm sob o ódio que o povo tem da
justiça, das prisões e, portanto, não são contra as injustiças, mas contra o
poder. Isso Deleuze viria a completar, com relação à circulação nos jornais,
dizendo que o que se encontra na realidade, por exemplo, dentro de uma escola
ou de uma prisão, é muito diferente do conteúdo da informação midiática
circulante em sua grande parte.
Hoje
notamos um impacto no discurso das pessoas, com destaque para as da classe
média, que o inscreve num posicionamento que, como desde há meses, defende a
redução da maioridade penal, o apoio a atitudes antidemocráticas, como impeachment
da presidente Dilma ou a comportamentos fascistas da polícia militar, entre
outros. Desse impacto, as mídias se fazem valer manobrando as deficiências e a
falta de clareza da população com relação aos manejos de poder.
De
modo mais primitivo, não há clareza sobre a exploração imanente ao sistema
capitalista, porque este é o sistema do não-dito,
apesar de sabermos quem são as empresas que mais lucram e quem são essas mãos
que recebem os lucros. O jogo de poder é difuso, escondido, por isso o discurso
das lutas se opõe ao segredo e este é difícil de escavar. Então, o que ocorre
com as pessoas que não têm tanto interesse no poder, mas o seguem, o agarram
com força e mendigam uma parcela dele? Talvez porque exista o desejo de investimento,
nascido do sistema e também alimentado por ele, o que justifica que a população
desejou o fascismo em algum momento. Assim, as pessoas conduzidas pelo desejo
que modela o poder, e que investem nesse desejo, no sentido econômico, se permitem
de maneira confortável ser manejadas pelas mídias amigas do sistema. Essas
mídias, por sua vez, também produzem informações de modo mais confortável, que
lhe assegurem adesão a seus propósitos articulados ao poder. Portanto, o desejo
material, que confere a uma pessoa algum grau de destaque na sociedade,
favorece os manejos de poder, caminhando com o conforto do irrefletido, e
explica porque esse mesmo poder se encontra tanto na polícia como no Estado.
Assim,
as manobras de poder são retroalimentadas pela própria sociedade. Quando
pensamos nas mídias como veículo de manipulação dos enunciados da informação,
sejam elas televisivas, radiofônicas, impressas ou da internet, faz-se
necessário despir das ideologias (ou ao menos fazer esforço para), reconhecendo-se
como sujeito quase sempre portador de um direcionamento político. É necessário sair da ilha para ver a ilha,
uma vez que os limites delineados pelas direções políticas tornam as
informações nebulosas e, com isso, mais confortáveis para serem adotadas
superficialmente.
Mas onde, afinal, encontramos os
outros veículos de informação que têm a preocupação de refinar a fidelidade à
informação? Essas mídias, raras, existem concentradas na internet, mesmo que
ainda em processo de refinamento e amadurecimento, pois é comum trazerem
resíduos da parcialidade ou da tendenciosidade. Mas elas trabalham com o
esforço para trazer a informação com embasamento intelectual, confrontada com
os questionamentos teóricos e históricos. Em geral, por isso, seus textos são
mais extensos, de modo a desenvolver reflexão coerente, escavando os fatos, os
enunciados e as motivações, com o cuidado de afastar as tendências
especulativas totalmente.
Bem,
termino com uma inquietação óbvia, mas não menos nebulosa: Embora existam as
mídias críveis, ainda assim a grande parte das pessoas não está interessada
nesses veículos de informação em sua proposta de verdade. É comum, mas não pode
ser tratado como normal. É mais confortável, mas não menos grave. Aliás,
gravíssimo.
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